sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

Coxinhização: Brasileiros desprezam a América Latina, mas querem liderança regional

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Uma pesquisa inédita de opinião pública confirmou o que a história e o senso comum já sugeriam: o brasileiro despreza a América Latina, mas ao mesmo tempo se vê como líder nato da região.
Apenas 4% dos brasileiros se definem como latino-americanos, ante uma média de 43% em outros seis países latinos (Argentina, Chile, Colômbia, Equador, México e Peru).
E mais: quem mora no Brasil avalia que o país seria o melhor representante da América Latina no Conselho de Segurança da ONU, mas não quer livre trânsito de latinos por suas fronteiras nem priorizar a região na política externa.
Os resultados estão na edição 2014/2015 do projeto The Americas and the World: Public Opinion and Foreign Policy (As Américas e o Mundo: Opinião Pública e Política Externa), coordenado pelo Centro de Investigação e Docência em Economia (Cide) do México, em colaboração com universidades da região.
No Brasil, o responsável pela iniciativa é o Instituto de Relações Internacionais da USP (Universidade de São Paulo), que aplicou 1.881 questionários no país.
Em uma das questões, os entrevistados deveriam apontar os gentílicos e expressões com os quais mais se identificavam. A principal resposta foi “brasileiro” (79%), seguida por “cidadão do mundo” (13%), “latino-americano” (4%) e “sul-americano” (1%).
O Brasil foi o único entre os sete países da pesquisa em que o adjetivo pátrio ficou entre as três principais opções dos entrevistados.
Argentinos, chilenos, colombianos, equatorianos e peruanos indicaram “latino-americano”, “sul-americano” e “cidadão do mundo”. E a segunda e terceira opção dos mexicanos depois de “latino-americano” foram, respectivamente, “cidadão do mundo” e “norte-americano”.
O estudo também fez a seguinte questão aos participantes: em qual região do mundo seu país deve prestar mais atenção?
Na mesma linha do item sobre identidade, o Brasil foi o único na pesquisa a não priorizar a América Latina. Na opinião dos entrevistados, o foco da política externa deve ser a África (24%), depois América Latina (16%), seguida de perto por Europa (13%) e América do Norte (9,5%).
Nos outros países a opção pela América Latina predominou, com percentuais de 57% (Argentina) a 30% (Chile e Peru).
Autoidentificação ambivalente
Para os autores da pesquisa, os resultados comprovam, com dados de opinião pública, o que historiadores e cientistas sociais já apontavam: a autoidentificação do brasileiro é tênue e ambivalente, marcada pela percepção de pertencer a uma nação diferente dos vizinhos, seja pela experiência colonial, língua ou processo de independência distinto.
“A primeira explicação é a colonização. América Latina sempre se associou à colonização espanhola, e isso já gera uma divisão com o passado português do Brasil”, afirma o argentino Fernando Mourón, pesquisador do Centro de Estudo das Negociações Internacionais da USP e participante do estudo regional.
“Depois temos os processos de independência na região. Na América espanhola houve guerras contra a Coroa e o reforço de uma identidade cultural única, enquanto no Brasil o próprio regente português declarou a independência.”
A economia por muito tempo fechada aos vizinhos, a geografia continental que dificulta conexões físicas e o histórico diplomático também ajudam a explicar o “isolamento” brasileiro, avalia Mourón.
Sobre esse último ponto, em artigo ainda inédito sobre os resultados do estudo, Mourón e os colegas da USP Janina Onuki e Francisco Urdinez lembram que até o final da Guerra Fria diplomatas brasileiros acreditavam que a melhor estratégia para aprimorar a inserção internacional do país era manter distância de questões regionais.
“Uma das consequências foi que, até a metade dos anos 1980, as elites brasileiras e a população em geral viram a América Latina não como construção maior de identidade coletiva, mas apenas como a paisagem geográfica imediata em torno do país”, escrevem os autores.
Liderança contraditória
Ao analisar os dados da amostra, que é representativa de toda a população dos países analisados, os pesquisadores concluem que os brasileiros enxergam seu país como líder regional, mas em geral resistem a possíveis implicações de assumir tal posição.
Questionados sobre qual país deveria assumir uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU caso o órgão abrisse uma vaga para a América Latina, por exemplo, a maioria dos brasileiros (66%) indicou o próprio país.
O Brasil também foi a primeira opção dos entrevistados nos demais países do estudo, exceto as outras duas maiores economias, Argentina e México, onde os moradores também “elegeram” seus próprios países, com 60% e 54%, respectivamente.
Por outro lado, a maioria dos brasileiros (54%) discorda do livre movimento de pessoas na região sem controles fronteiriços. A maior fatia dos entrevistados também se opõe ao trabalho de sul-americanos no país sem visto (66%) e rejeita (65%) a possibilidade de intervenção brasileira em uma possível crise militar regional.
Quando o assunto é a “liderança pela carteira”, ou seja, a ajuda financeira a países menos desenvolvidos da região, 65% dos entrevistados no Brasil disseram concordar com essa possibilidade.
Mas o índice do Brasil nesse item foi o menor de todos os países, e ademais os pesquisadores alertam que os altos índices nas respostas podem estar relacionados à tendência – identificada nos estudos de opinião pública – de participantes a responder perguntas de fundo moral baseados no que pensam ser algo social e politicamente correto.
Problemas na vizinhança
A partir do governo Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010), a ênfase da diplomacia brasileira na integração regional, como foco na América do Sul, expõe o reconhecimento tácito da dificuldade do país em exercer influência em todo o “continente” latino, avaliam Mourón e os pesquisadores do Instituto de Relações Internacionais da USP.
Mas em geral, quando o assunto é opinião pública no Brasil, a América Latina é vista mais como preocupação e problema do que benefício, conclui o estudo.
Percepção que, afirma Mourón, acaba tendo respaldo na realidade, diante da série de percalços que o país enfrentou na última década com os vizinhos, como o episódio da nacionalização dos ativos da Petrobras na Bolívia, a expulsão da Odebrecht do Equador, as barreiras de comércio entre Brasil e Argentina e a frustrada sociedade com a Venezuela na construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco.

As identidades dos playboys que atacaram Chico Buarque

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Perdeu, playboy: Túlio Dek (esq.) e Alvarinho (dir.), dois dos agressores de Chico Buarque.
“Você é um merda”, “petista ladrão”, foram algumas das frases direcionadas a Chico Buarque. Identidade dos jovens foi revelada e amigos que presenciaram as provocações, artistas, políticos e o próprio compositor também se pronunciaram sobre o incidente
Chico Buarque foi abordado por um grupo de jovens na noite da última segunda-feira no Leblon, quando saía de um restaurante em que acabara de jantar com amigos. Depois da confusão, um dos agressores, o rapper Túlio Dek, “conhecido” na mídia apenas por ser o ex-namorado da atriz Cleo Pires, afirmou em entrevista ao Estadão que o ícone da MPB “é um ídolo” para ele.
“Chico é um ídolo para mim. Só não entendo como um dos maiores ícones do Brasil continua apoiando cegamente o PT. Minha indignação foi com o cidadão e não com o artista”, disse.
Além de Dek, outro jovem que hostilizou Chico foi Álvaro Garnero Filho (mais conhecido como Alvarinho), filho do empresário e apresentador paulista Álvaro Garnero. “Petista, vá morar em Paris. Ladrão. Vá morar em Cuba. O PT é bandido”, diziam os jovens, que estavam exaltados e procuraram criticar o ativismo de Chico a favor do PT, algo que data dos tempos de fundação do partido.
Recentemente, Alvarinho causou controvérsia com um vídeo em que aparecia alcoolizado acariciando Ronaldo Fenômeno, que o chamava de namorado. O pai saiu em sua “defesa” quando o rapaz foi “xingado” de gay.
Mário Garnero, pai de Álvaro, portanto avô de Alvarinho, esteve no centro do “escândalo Brasilinvest”, banco de investimentos que fechou em 1985 porque mais da metade de seus empréstimos fora contraída por empresas “fantasmas”.
Garnero foi indiciado pela Polícia Federal por estelionato, formação de quadrilha e operações fraudulentas no mercado financeiro. Em 1997, teve a prisão preventiva pedida pela Procuradoria Geral da República.
Apoio“Chico foi um santo, um cavalheiro. Os meninos começaram a hostilizar, do outro lado da calçada. Chico atravessou e foi lá falar com eles. Esta cena de repressão nazista é um exemplo do que está acontecendo no Brasil: a absoluta intolerância. As discussões políticas estão indialogáveis. A disputa política se transformou em duelo. Eles não queriam argumentar, só xingar”, comentou na tarde de terça-feira, dia 22/12, o cineasta Cacá Diegues, que integrava o grupo de Buarque no restaurante.
Além de Cacá, o grupo de Chico contava com o cantor, compositor e arranjador Edu Lobo, os cineastas Miguel Faria Jr. e Ruy Solberg, e o jornalista e escritor Eric Nepomuceno.
“Você é um merda, quero ouvir da sua boca: quem apoia o PT o que é?”, perguntou um dos provocadores. “É petista”, respondeu o compositor. “É um merda”, interrompeu o rapaz. Em determinado momento, o grupo ironizou o fato de Chico Buarque ter um apartamento em Paris. “Para quem mora em Paris é fácil”, disse um deles. “Você mora em Paris?”, retrucou Chico. Mantendo o tom de voz baixo, mesmo diante da exaltação dos jovens, Chico Buarque disse achar que “o PSDB é bandido” para rebater o argumento de um dos provocadores, que garantiu que “o PT é bandido”.
Relembrando o episódio, Eric Nepomuceno lamentou que uma noite divertida com velhos amigos tenha sido encerrada com aquela discussão. “É muito impressionante a fúria agressiva dessa direita que saiu do armário embutido”, disse Eric na terça-feira, dia 22/12. “Estávamos numa ótima, de repente vieram os caras, muito agressivos. Eu estava mais irritado que o Chico, mas depois nós todos demos risada”, contou o escritor.
Segundo Eric, não foi o primeiro episódio de provocação, embora tenha sido o mais ostensivo. “Uma outra vez, o cara na mesa ao lado pegou o celular e falou com alguém ‘estou em um restaurante caríssimo de Ipanema onde os comunistas adoram vir’”, lembrou.
Ironicamente, Chico Buarque não se pronunciou com palavras sobre a polêmica, preferindo apenas postar em sua página no Facebook uma de suas músicas:
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A HISTÓRIA DO AVÔ DO RAPAZ QUE OFENDEU CHICO BUARQUEO rapaz que ofendeu Chico Buarque é pouco informado sobre as aventuras de seu avô, Mário Garnero, com o PT. O primeiro instante de celebridade do neto foi fotografar-se aos beijos com o ex-jogador Ronaldo.

Mário Garnero foi uma liderança estudantil importante. Depois, casou-se com uma herdeira do grupo Monteiro Aranha e passou a representar o sogro no capital da Volkswagen. Lá, como diretor de Recursos Humanos, conheceu e aproximou-se de Lula e dos sindicalistas do ABC. Mas toda sua carreira foi pavimentada no regime militar.
Foi responsável por um seminário internacional em Salzburg, visando vender o país aos investidores externos no momento em que os ecos do Brasil Grande projetavam a imagem do país no mundo.
Do seminário nasceu o Brasilinvest, um dos primeiros bancos de investimento do país tendo como acionistas diversos grupos internacionais. Garnero arrebentou com o banco desviando recursos para holdings fantasmas, como forma de se capitalizar para conquistar o controle absoluto da instituição. Quando terminou a operação, viu-se dono de um banco quebrado.
Antes disso, era o menino de ouro dos militares. Tornou-se num anfitrião de primeiríssima acolhendo em sua casa ou em um almoço anual nas reuniões do FMI, a fina nata do capitalismo mundial. Tornou-se, de fato, um dos brasileiros mais bem relacionados do planeta. Mas jamais conseguiu transformar o relacionamento em negócios legítimos. Não tinha a visão do verdadeiro empreendedor. Terminou cercado por parceiros de negócio algo nebulosos.
Acabou se convertendo na bomba-relógio que o general João Baptista Figueiredo deixou para Tancredo Neves. A desmoralização final dos militares foram os escândalos da Capemi, brilhantemente cobertos para a Folha pelo nosso José Carlos de Assis.
Figueiredo impediu Delfim Netto de ajudar Garnero, vaticinando: “O Brasilinvest será a Capemi do Tancredo”. A razão maior era a presença, no Conselho de Administração, de Aécio Cunha, pai de Aécio e genro de Tancredo. E também de personagens de peso na vida nacional da época, como o presidente da Volkswagen Wolfgang Sauer, Hélio Smidt, da Varig, e o publicitário Mauro Salles.
Colhi depoimento de Sauer sobre o episódio e testemunhei o alemão de ferro chorar em minha frente pela traição do amigo Garnero.
Percebendo a armadilha, Tancredo incumbiu seu ministro da Fazenda, Francisco Dornelles, de não facilitar em nada a vida da Brasilinvest. Da derrocada de Garnero, valeu-se Roberto Marinho para tomar-lhe o controle da NEC Telecomunicações.
Depois disso, continuou a vida tornando-se uma espécie de João Dória Jr. internacional. Aos encontros anuais da Brasilinvest comparecia a fina flor do capitalismo – e modelos belíssimas. Aliás, a capacidade de selecionar mulheres era uma das especialidades de Garnero, que conseguiu um encontro de Gina Lolobrigida para seu sogro.
No início do governo Lula, Garnero valeu-se da familiaridade dos tempos de ABC para se aproximar de José Dirceu, ainda poderoso ministro da Casa Civil. A aproximação lhe rendeu prestígio e bons negócios.
Graças a ela, conseguiu levar o Instituto do Coração para Brasília, em um episódio controvertido que estourou tempos depois, com boa dose de escândalo. Aliás, até hoje respondo a um processo maluco do Mário Gorla, o sócio de Garnero no empreendimento. Esteve também por trás dos problemas do Instituto do Coração em São Paulo.
Mario_Garneiro02_Neto_RonaldoQuando os chineses começaram a desembarcar no Brasil, fui procurado por analistas da embaixada da China interessados em informações sobre o país. E me contaram que estavam conversando com um BNDES privado. Indaguei que história era essa. Era o Brasilinvest – na ocasião um mero banco desativado, localizado em uma das torres do conjunto Brasilinvest na Avenida Faria Lima. Não sabiam que Garnero já se desfizera totalmente do patrimônio representado pelas torres. E tinha um banco de fachada.
Garnero ajudou na aproximação de Dirceu com parte dos empresários norte-americanos. Na véspera do estouro do “mensalão”, Dirceu já tinha uma viagem agendada para Nova Iorque organizada por ele.
Sem conseguir se enganchar no governo Lula, Garnero acabou se dedicando ao setor imobiliário. Os filhos não seguiram sua carreira, internacionalmente brilhante, apesar dos tropeços. Ficaram mais conhecidos pelas conquistas e pela vida vazia.
Já o neto consegue seu segundo instante de celebridade. O primeiro foi em um vídeo polêmico, simulando um agarra com o ex-jogador Ronaldo.
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A HISTÓRIA DO AVÔ DO RAPPER QUE INSULTOU CHICO
Sobre o episódio da ofensa e patrulha ideológica perpetradas por playboys herdeiros das capitanias hereditárias e antipetistas contra Chico Buarque no Leblon, ainda duas considerações:
1) A primeira é que, como sugerido, fui ao Google procurar saber quem é o tal “rapper” Túlio Dek (um dos ofensores de Chico Buarque) e o que encontrei, entre platitudes sobre sua vida amorosa passada em sites que se ocupam de subcelebridades, foi a informação de que ele é neto de Jairo Andrade. E, de acordo com esta matéria de 2007 do site A Nova Democracia, o avô de Túlio Dek não era flor que se cheirasse!
Jairo Andrade Bezerra, falecido há 4 anos, nasceu em Passos (MG) e foi extrema-direita de carteirinha. Entusiasta organizador da Marcha com Deus, pela Família, pela Liberdade em 1964, atividade patrocinada pela CIA, que antecedeu ao golpe militar que derrubou o governo constitucional de João Goulart.
Foi para o sul do Pará no final dos anos 1960 e sempre teve apoio da ditadura militar para cometer todo tipo de desmandos na região. Roubou terras dos indígenas, posseiros e dos colonos assentados pelo Incra no assentamento Agropecus.
Jairo recebeu nove autuações por trabalho escravo. Teve seu nome incluído na Lista Suja do Trabalho Escravo, condenado por manter 97 trabalhadores escravizados na Fazenda Forkilha. Seu irmão, Gilberto Andrade recebeu igual condenação por trabalho escravo na fazenda Boa Fé, em Centro Novo (Maranhão). Apesar de denunciado por trabalho escravo (desde final dos anos 60), Jairo Andrade nunca deixou de receber recursos públicos da Sudam para investir em sua propriedade.
Foi fundador da criminosa e arqui-reacionária União Democrática Ruralista (UDR), em 1985, sendo seu primeiro tesoureiro nacional. Subiu no palanque com Fernando Collor em Redenção nas eleições presidenciais de 1989. Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, em 5/11/1994, Jairo Andrade - acusado de contratar pistoleiros para assassinar o ex-deputado e advogado de posseiros Paulo Fonteles e inúmeros trabalhadores rurais - não desconversou: descreveu mortes das quais participou, informou onde enterrou as vítimas e fez ameaças. Como sempre acontece com os crimes do latifúndio em nosso País, nada aconteceu a este bandido, réu confesso.
Bom, o tal Túlio Dek teve todas as oportunidades de ser alguém melhor que seu avô. Mas, a julgar pelo que fez a Chico Buarque; a julgar pelo tipo de valores que subjaz a seu discurso de analfabeto político e alienado (discurso que é também o dos outros playboys companheiros seus), Túlio Dek decidiu dar continuidade à capitania herdada.
E assim podemos traçar a genealogia dos canalhas que hoje aplaudem a tentativa de um novo golpe na democracia e de desmonte da Constituição Cidadã de 1988!
2) A segunda coisa é que quando comentei que publicaria esse texto, um amigo meu me disse que não o fizesse porque as pessoas de direita fascistas me atacariam na internet com insultos e calúnias; ao que eu lhe respondi:
Meu caro, os fascistas, velhos e novos, já me insultam, caluniam e difamam na internet. Não só a mim, mas a todas as pessoas que se coloquem a favor da justiça social, das liberdades individuais, das minorias sexuais, étnicas e religiosas, da democracia, da honestidade intelectual e da vida com pensamento. Atacar essas pessoas com insultos impublicáveis e calúnias; deturpar suas falas; criar perfis falsos e robôs para encher caixas de comentários com discursos de ódio, enfim, destruir a civilidade e o respeito nas redes sociais é a nova forma de censura desses fascistas, sejam os novos, sejam os antigos. Muita gente, temendo essa violência simbólica (que ameaça ser física o tempo todo), cala-se ou se dedica a publicar platitudes para receber likes. Eu não! Jamais vou me acovardar diante de fascistas, pois corro o risco de ser cúmplice deles nessa covardia. Com Chico Buarque, aprendi a me perguntar: “Como beber dessa bebida amarga; tragar a dor; engolir a labuta? Mesmo calada a boca, resta o peito. Silêncio na cidade não se escuta!”. Ninguém vai aproximar de mim novamente o cálice (o “cale-se!”) de vinho tinto de sangue, pois não vou deixar! Vou escrever, sim, esse texto e defender, sim, Chico Buarque.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Receita cobrará R$2 bilhões de empresas incluídas na malha fina

A partir de terça-feira, dia 14/12, cerca de 15 mil empresas em todo o país serão avisadas de que foram incluídas na malha fina da pessoa jurídica. A Receita Federal detectou suspeita de sonegação de R$2 bilhões provenientes da diferença entre os valores pagos de Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e os valores informados na Declaração de Tributos e Contribuições Federais (DCTF) do ano-base de 2013.
O Fisco enviará cartas aos endereços cadastrais das pessoas jurídicas, informando que os contribuintes têm até fevereiro para regularizar a situação. Quem não retificar as informações fornecidas ou o tributo pago a menos dentro do prazo será autuado e, dependendo do caso, poderá ser denunciado ao Ministério Público Federal por crime de sonegação.
“Neste primeiro momento, o objetivo é dar oportunidade para se autorregularizar em vez de punir com multas que podem chegar a 225%”, diz o coordenador-geral de Fiscalização da Receita, Flávio Vilela Campos. A autorregularização pode ser feita no Centro de Atendimento Virtual da Receita (e-CAC).
Esta é a segunda vez que a Receita realiza a fiscalização da malha fina das pessoas jurídicas. Em fevereiro deste ano, o Fisco enviou 25,6 mil cartas a contribuintes relativas a divergências entre a DCTF e o pagamento de IRPJ e da CSLL em 2012. Do total de R$7 bilhões detectados pela Receita na época, os empresários retificaram e pagaram R$6 bilhões por meio da autorregularização.
A diferença de R$1 bilhão não regularizada no primeiro lote da malha fina das pessoas jurídicas será cobrada em fevereiro de 2016, junto com o segundo lote da malha fina anunciado hoje. “Optamos por juntar a fiscalização de dois anos-calendário para dar mais eficiência aos trabalhos”, justificou o coordenador da Receita. Segundo ele, cerca de 1,3 mil contribuintes não fizeram a autorregularização.
Segundo Campos, a Receita promoverá mais cruzamentos de dados em 2016 para elaborar mais listas de malha fina de empresas. A fiscalização não se restringirá ao IRPJ e à CSLL, abrangendo as notas fiscais eletrônicas e o pagamento da contribuição dos empresários à Previdência Social.

A política sórdida e o sofrimento dos brasileiros



Sórdida é a política que defende seus interesses acima da realidade dos brasileiros, que continuam sendo mortos no campo – 46 assassinatos, o maior número desde 2004-, da maior tragédia ambiental do país, com a destruição de comunidades, do sustento da agricultura familiar que povoava a região da bacia do rio Doce, dos ecossistemas que foram soterrados pela lama tóxica e o PMDB elege o deputado federal Leonardo Quintão, de Minas Gerais, que é o garoto propaganda das mineradoras, como líder na Câmara dos Deputados. O relator do novo Código da Mineração é amigo do advogado Carlos Vilhena, que no início de dezembro apareceu no noticiário nacional, por ser responsável por acrescentar trechos do novo código. O advogado diz que sua participação foi voluntária, que é militante do setor mineral, além de integrante do escritório Pinheiro Neto, especialista em direito ambiental, que defende a Vale e a BHP.

A tragédia provocada pela mineradora Samarco, empresa que em 2022 pretendia dobrar de valor no mercado – e teve lucro de R$2,8 bi em 2014- faz parte da crônica da morte anunciada, assim como tantos outros eventos ocorridos no Brasil. No ano passado a mineradora inaugurou sua quarta usina de pelotização em Ponta de Ubu, no município de Anchieta (ES). O minério segue por 400 km no mineroduto – a empresa têm três minerodutos. A produção aumentou 37% com a nova usina, para 30,5 milhões de toneladas de pelotas. Desde 2013, a mineradora Samarco acompanha a tramitação de uma licença ambiental para o “Alteamento da Unificação das Barragens Germano e Fundão”, na Secretaria do Meio Ambiente Sustentável, de MG.

A Samarco trabalhava na unificação das barragens

O fato foi noticiado na segunda semana de dezembro como se fosse uma novidade. A última vistoria sobre o processo foi realizada em 11 de junho de 2014. A área atingida seria de 831,29ha, parte de mata nativa que seria detonada. O empreendimento, como diz o documento da Secretaria mineira está localizado a 2,7km do Parque do Gandarela, a única região ainda livre das mineradoras. Então, os especialistas perguntam: qual será a causa da tragédia? A barragem de Germano estava esgotada desde 2009, com 200 milhões de m3 de rejeitos. Precisavam alargar essa área, subir a barreira de 920 para 940m, e continuar jogando rejeito. A Vale tinha uma tubulação que distribuía o rejeito do Complexo da Alegria direto na Barragem do Fundão. O Departamento Nacional de Pesquisa Mineral, que fiscaliza o setor mineral, não sabia disso.

Mais: o DNPM logo depois da tragédia disse que a Vale em 2014 jogou 28% do rejeito acumulado no Fundão. A Vale tinha licença para despejar 5%. E logo depois do anúncio do DNPM pediu uma revisão dos números do órgão estatal. Essa é uma tática dos extratores, que assim como as petrolíferas, cooptam os setores fiscalizadores do Estado, entregam doações – caminhões, ambulâncias, equipamentos hospitalares – para demonstrar sua responsabilidade corporativa, suas metas do milênio da ONU. Depois vão colocar sua rede complexa de advogados especialistas para pagar o menor volume possível de indenizações.

A British Petroleum, responsável pela tragédia do Golfo do México em 2010 assinou em outubro de 2015 um acordo comm a Procuradoria Geral dos Estados para pagar 20 bilhões de dólares de indenizações pelos prejuízos. Pagou US$1,8 bi para os pescadores estadunidenses, mas deixou 25 mil mexicanos de fora – porque o governo de Felipe Calderon não processou a petrolífera. Os moradores ainda sofrem de depressão e ansiedade no Golfo do México – 20% da população segundo estudo da Universidade da Flórida, juntamente com três outras universidades. Entretanto, a petrolífera já têm prontos estudos que comprovam que não há dano permanente na região. Quarenta e oito mil pessoas foram afetadas por trabalharem na limpeza da lama oleosa e fétida, com produtos químicos contaminantes.

Laudo Técnico Preliminar do IBAMA

A batalha será longa no Brasil. Li o Laudo Técnico Preliminar da Coordenação Geral de Emergências Ambientais do IBAMA, que chegou à região do rio Doce dia 17 de dezembro para avaliar os impactos do soterramento. A lama tóxica carregada de metais pesados – cádmio, chumbo, cobalto, níquel, entre outro, além de arsênio matou os moradores, peixes e aves por asfixia. O ecossistema da Bacia do rio Doce, já detonado por constantes agressões ambientais – em Governador Valadares a vazão estava em 60m3 por segundo ao invés de 170 como seria o normal- e pela seca, mesmo assim mantinha uma quantidade enorme de espécies de peixes, aves e mamíferos.

O grupo de analistas recolheu 7.410 peixes moribundos, de 21 espécies – no rio Doce são 80 espécies, 11 consideradas em risco de extinção e 12 endêmicas. Muito pior: em 1º de novembro começa o período de piracema na região, que se estende até 28 de fevereiro. Os peixes sobem o rio para desovar. Os técnicos do IBAMA encontraram curimbatás com 800 gramas de ovas, 640 mil ovócitos, e alguns peixes pesando mais de 25 quilos, que ninguém imaginava que ainda existisse no rio Doce. A coleta foi realizada apenas em 150 km – a lama percorreu 663,2 km- do Baixo Gundu até Linhares, na foz. A maioria dos peixes da região é de pequeno porte, e muitos se deterioram rapidamente ou sequer vieram à tona. Daí saía o sustento de 1.249 pescadores profissionais de 41 municípios. Sem contar os outros moradores que tinham a possibilidade de pescar para consumo próprio.

Mercúrio utilizado no garimpo durante décadas em Mariana

Além da destruição total das comunidades, dos contaminantes que a lama fétida disseminou na região, os técnicos do IBAMA ainda comentaram outra variante da tragédia. A região de Mariana é um garimpo de ouro histórico, ainda hoje existe garimpagem no rio do Carmo. Significa que o mercúrio usado na separação do ouro do dolo e de outros materiais durante décadas – ele permanece no ambiente mais de 100 anos – que estava no leito do rio e de outros córregos, ou nas bordas em plantas, foi novamente colocado em suspensão.

“- Mesmo que os estudos e laudos indiquem que a presença de metais não esteja vinculada diretamente à lama de rejeitos da barragem do Fundão há de se considerar que a força do volume do rejeito lançado quando do rompimento da barragem provavelmente revolveu e colocou em suspensão os sedimentos de fundo dos cursos d’águas afetados, que pelo histórico de uso e relatos na literatura já continham metais pesados”, diz o Laudo Técnico Preliminar do IBAMA.

Para complementar: “o revolvimento possivelmente tornou tais substâncias biodisponíveis na coluna d’água ou na lama ao longo do trajeto alcançado, sendo a empresa Samarco responsável pelo ocorrido e pela consequente recuperação da área”.

A CPI do Pó Preto

E aqui temos outra questão: os rejeitos tóxicos terão que ser retirados do local, pois os próprios técnicos constaram até um metro de lama em algumas áreas. Para onde levarão os rejeito? A própria construção da barragem de rejeitos, com os próprios contaminantes já é uma estratégia barata das empresas, para não resolver a questão do que sobra do processo, que é um volume absurdo, perto do que é aproveitado.

Menos de um mês antes do soterramento nos afluentes Gualaxo do norte e do Carmo e depois em quase todo o rio Doce, em Vitória e na região metropolitana, a população participava da CPI do Pó Preto na Assembleia Legislativa, que entregou o relatório final no dia 7 de outubro. Trata-se do impacto na ponta final do processo de extração – a transformação do minério em pelotas, ou a fundição para produzir o aço. Em Vitória e Anchieta, a Vale têm oito usinas de pelotização, mais as quatro da Samarco e duas siderúrgicas da Arcelor Mittal. A Vale tem o maior terminal portuário de ferro e pelotas do mundo em Tubarão, na parte continental de Vitória.

O pó preto segue matando no Espírito Santo

O pó preto é liberado na atmosfera, carregado de ferro, manganês, enxofre, são partículas finas, algumas menores do que 2,5 micrometros, que entram nos alvéolos pulmonares e provocam infecções de todo tipo. Mais do que isso, também aumentam a incidência de doenças cardiovasculares, como infarto e AVC. Uma pesquisa da Secretaria Municipal de Vitória entre 2005 e 2009: o pó preto era responsável por 26% das internações por doenças respiratórias em menores de cinco anos; 25% das internações por doenças respiratórias em maiores de 60 anos e 22% das internações por doenças cardiovasculares em maiores de 45 anos.

A organização Mundial de Saúde já constatou que a poluição por material particulado de pequena dimensão tem impacto sobre a saúde mesmo em concentrações muito baixas. As empresas se baseiam em uma resolução do CONAMA de 1990 para liberar o pó preto. Em 2013, o governo estadual baixou um decreto para definir os limites. Os índices são o dobro do permitido pela OMS. Os representantes da Vale na CPI do Pó Preto declararam que a empresa é responsável por 15,8% da poluição e a Arcelor Mittal por 5%.

As recomendações da CPI incluem construção de hospitais, inclusive com UTI infantil, e o enquadramento dos rejeitos atmosféricos nos padrões da OMS. As empresas querem até 15 anos para se adaptarem. No dia 1º de dezembro no Vale Day, em Nova York o presidente da mineradora Vale, Murilo Ferreira disse que a empresa se isenta de responsabilidade legal pelo desastre. Já o diretor executivo de finanças, Luciano Pires disse que a empresa tinha duas conquistas em 2015: a entrega de projetos e a expressiva redução de custos. Ele lamentou o soterramento em Mariana, mas diz que a Vale tem o compromisso de tornar o rio Doce melhor. 

A causa da maior tragédia do país foi a redução de custos dos extratores, para entregar dividendos aos acionistas. Sobre o resto, contarão com seus aliados políticos, que eles pagam e com a complacência da justiça, que é muito eficiente, quando tem a oligarquia da mídia do seu lado. E retrógrada e tardia, quando se trata de corporações bilionárias.

Povo tirou país do abismo

O Brasil viveu vários acontecimentos importantes nos últimos dias. Mas é essencial não perder a noção correta sobre cada coisa. Hoje o Planalto respira mais oxigênio e a fase mais aguda da crise pode ter sido vencida, ao menos até o próximo ataque. O STF mostrou-se capaz de tomar uma decisão responsável em defesa das garantias democráticas no encaminhamento de um processo de impeachment que sequer deveria ter sido iniciado. Até a disputa interna do PMDB assume um aspecto menos doentio. A saída do ministro da Fazenda identificado com a pior recessão econômica enfrentada pelo país em 30 anos tornou-se inevitável.
Na origem de todas essas mudanças, que abrem a possibilidade do país seguir um novo curso político e retomar uma história interrompida por uma inaceitável iniciativa golpista nascida única e exclusivamente de uma derrota eleitoral, a quarta em seguida, é sempre bom lembrar, encontra-se num acontecimento principal: a mobilização do dia 16.
Quando o país foi colocado a beira do abismo, a população arregaçou as mangas e foi a rua defender seus direitos, sua liberdade e a história de uma democracia construída com esforço e vários momentos de luta. Os números do dia 16 são grandiosos, definitivos. Tão eloquentes que a tentativa de esconder sua grandeza, sua eloquência, sua força de manifesto político, não permite dúvidas nem divagações. Num país silenciado, manipulado, ouviu-se uma mensagem clara que recusa o retrocesso social e a vergonha política.
Apanhados de surpresa, o último esforço dos adversários do povo foi tentar comparar uma mobilização a outro, uma ideia e outra, um projeto contra outro, numa espécie de Fla x Flu exótico entre governo e oposição. Em vão. Embora tentem nos dar a impressão de que somos simples espectadores num programa de auditório, só se pode comparar aquilo que é semelhante, equivalente, permutável. E não é disso que se trata. Numa democracia, as comparações, as avaliações e escolhas são feitas nas urnas e através de outros caminhos legítimos de luta política. Fora disso, é golpe.
O dia 16 deixou claro que os brasileiros compreendem muito bem que é o destino de seu país que está em jogo. Tiveram maturidade de defender a legitimidade de um governo eleito por mais de 54 milhões de votos, sem deixar de manifestar seu desacordo com a situação, seu descontentamento com ameaças a direitos e conquistas. Essa lealdade indispensável de quem sabe distinguir o principal do secundário, mas não perdeu a noção de seus valores e interesses, permitiu a abertura de um novo momento político, tornando impossível a manutenção de tudo como está.
As articulações pela saída de Joaquim Levy, concretizada na sexta-feira, dia 18/12, com sua substituição por Nelson Barbosa, já demonstravam o caráter urgente de uma mudança que pode equivaler a um segundo mandato para Dilma.
(Não custa registrar. Nos piores dias da campanha de 2014, foi um movimento semelhante que garantiu a vitória na reta final, o que demonstra o papel essencial da mobilização popular na formação deste governo.)
O momento permite esperar que elas ocorram na direção acertada, de erguer a esperança dos brasileiros que, no dia 16, foram a rua, acima de tudo, porque não perderam a confiança em suas próprias forças.
Por uma dessas coincidências felizes, mas que fazem parte de um processo maior, no mesmo dia 16 ocorreu uma mudança no debate sobre o orçamento no Congresso. Por meio da redução de 2% no superávit primário, garantiu-se um reforço de R$10 bilhões nas verbas do Bolsa Família, ameaçado de um corte que iria devolver 7,9 milhões de brasileiros à miséria. Não mais. Ao menos o Bolsa Família saiu da linha de risco e está preservado para 2016. Não se fez uma melhoria. Evitou-se uma piora. No ambiente atual, é um avanço.
Embora os adversários do governo tenham tentado transformar a notícia da perda do grau de investimento pela agência Fitch numa grande novidade, ela é apenas um novo sinal de fracasso de uma política econômica que, sustentada a ferro e fogo pela oposição, vinha dando errado em todos os pontos fundamentais, inclusive do ponto de vista de seus próprios objetivos. A preservação do mais bem-sucedido programa de distribuição de renda do país é um bom sinal. Pode até ser apenas um símbolo. É. Mas é um bom símbolo do que pode ser o Brasil pós-16 de dezembro. Veremos.

Direita brasileira: Não aprendem nada, não esquecem nada

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Essa direita sempre se caracterizou pelo golpismo. Nunca foi boa em ganhar eleições. Sempre tentaram o golpe, pela força ou por artifícios jurídicos.
Tocqueville dizia que quando o passado não ilumina o futuro o espírito vive em trevas. Ainda vivemos a luta entre forças sociais e políticas que emergiram no final da 2ª Guerra.
Derrotado o nazifascismo, dois blocos se estruturaram globalmente. O reflexo disto entre nós está na gênese da direita contemporânea brasileira, especialmente desprezível. Entreguista, sempre de joelhos perante os interesses dos EUA, arrogante e incapaz de disfarçar o desprezo pelo povo.
No imediato pós-guerra esta direita se aglutinou e se articulou na oposição ao ditador Vargas na UDN, abrigando alguns liberais de boa cepa, mas também, ao longo de seu triste percurso, o mais deslavado golpismo.
Por uma opção estratégica, na perspectiva dos dois blocos globais e não por alguma estima a Vargas, que havia massacrado os comunistas, a esquerda e forças populares apoiam Getúlio e Prestes divide palanques com o ditador que entregou sua mulher grávida, judia, à Alemanha nazista, para morrer em um campo de concentração.
Essa direita sempre se caracterizou pelo golpismo. Nunca foi boa em ganhar eleições. Perdendo-as, seguia-se imediatamente a tentativa de golpe, pela força ou por artifícios jurídicos.
Getúlio candidato em 1950, o golpista Lacerda profere a célebre frase: “O senhor Getúlio Vargas, senador, não deve ser candidato à presidência. Candidato, não deve ser eleito. Eleito não deve tomar posse. Empossado, devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar.” Começamos a ver que não há exatamente algo de novo neste nosso momento: após a vitória de Vargas, a UDN vai ao TSE defender a tese, extravagante diante da Constituição de 1946, de que havia necessidade de maioria absoluta e assim impedir a posse do presidente eleito. Não é original a prática de arregimentar juristas amigos para estraçalhar textos constitucionais claros.
Eleito e empossado, Vargas no segundo governo não se alinha automaticamente aos EUA e adota medidas populares. Surge a Petrobrás, alvo permanente e obsessivo da direita brasileira. O ministro do Trabalho João Goulart é forçado a demitir-se por pressão dos militares ao conceder reajuste de 100% do salário-mínimo. Sob feroz ataque da imprensa, a crise de agosto de 1954 leva Getúlio ao suicídio, gesto que adia por 10 anos o golpe.
A UDN perde novamente as eleições de 1955 e mais uma vez, liderada pelo renitente golpista Lacerda, recorre aos Tribunais ressuscitando a tese da maioria absoluta para impedir a posse de Juscelino.
A renúncia de Jânio dá ensejo a nova tentativa de golpe, derrotada pela corajosa resistência de Brizola, que garante a posse de Goulart.
Em 1964, por fim, triunfa o ansiado golpe da direita que atrasou o desenvolvimento do país, manteve e aprofundou a estrutura desigual da sociedade brasileira, alinhou definitivamente o Brasil aos EUA e aos interesses imperialistas e, para tudo isso, exilou, matou e torturou.
Olhando para 1946, 1950, 1954, 1961 e 1964 contemplamos agora algo de novo? Vimos nas eleições de 2014 que Lacerda não morreu. Proclamado o resultado das eleições, imediatamente a palavra de ordem da direita golpista é impeachment. Os fundamentos exatos eles veem depois.
O espírito de Lacerda vive em Aécio, Serra e cúmplices, mas suspeito que Lacerda talvez tivesse algum pudor de dar sustentação e proteger a delinquência de Eduardo Cunha.
Realmente, nada de novo. Nos métodos e nos fins. Nos anos 50, o objetivo era entregar o petróleo a interesses estrangeiros, arrocho salarial, etc. Hoje, aprofundar o neoliberalismo, eliminar direitos sociais, entregar o pré-sal, como persegue obsessivamente Serra, garantir um superávit primário que remunere parasitas rentistas, abocanhando recursos da saúde, educação, previdência, moradia, etc. Nunca e nenhuma palavra, por exemplo, sobre a histórica e iníqua desigualdade que condena milhões de brasileiros a uma subvida, ou sobre o massacre de jovens e negros nas periferias.
Não se trata de barrar o impeachment como defesa político-partidária do governo Dilma, o que, per se, é uma tarefa inglória, do mesmo modo como era inglório subir aos palanques de Vargas em 1945. Ela cometeu erros em série que aplainaram os caminhos da tentativa de golpe. Isolamento das forças que a elegeram com um ajuste fiscal torpe, lei antiterrorismo, indiferença ante a brutalidade do aparato repressivo do Estado, completa ausência de uma política de direitos humanos (como ocorreu também, aliás, nos anteriores governos do PT). O corpo humano não consegue distinguir a porrada no Estado de Direito e a porrada nos regimes autoritários. Elas doem igualzinho.
Há, no entanto, dois aspectos que levam à defesa do seu mandato.
Em primeiro lugar, do outro lado está o adversário extremo e histórico das forças populares, a velha direita golpista brasileira e seu projeto antipopular que, em seu arco de alianças, reúne hoje tudo que há na sociedade de retrógrado, obscurantista e pré-iluminista.
Um segundo aspecto expresso com as palavras de Ivo Tonet, professor de Filosofia da Federal de Alagoas: “Marx já afirmava que a democracia burguesa é o melhor espaço para o proletariado levar a sua luta contra a burguesia até o fim. O que significa que a democracia é um meio, não um fim. O fim é a emancipação humana. Então, certamente, defender a democracia é do interesse dos trabalhadores, mas, enquanto isso, é preciso avançar em direção ao objetivo maior: a revolução, o socialismo, a efetiva liberdade humana, o fim de toda exploração e dominação do homem pelo homem”.
De qualquer modo, e ainda que a perspectiva não seja a estritamente marxista, não interessa aos excluídos a quebra da ordem constitucional conquistada após a ditadura militar, mormente com este assustador avanço das forças retrógradas.
Ajudaria se a presidenta Dilma deixasse de adotar o programa dos que querem derrubá-la, supondo que de joelhos defende melhor seu mandato e sua trajetória política. A lógica mais trivial assegura que é melhor amparar-se nos aliados do que nos adversários e que não é razoável esperar que seu mandato seja defendido nas ruas pelos que sofrem na carne os efeitos das duras medidas adotadas no segundo mandato.
Enfrentando o histórico golpismo da repugnante direita brasileira, que nada aprende e nada esquece, que Dilma olhe o passado e não nos arraste de vez para as trevas.

Os 7 passos para matar uma estatal

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A trajetória recente da Eletrobras indica que o governo federal retomou a tentativa de aplicar a receita fatal.
Em 1990, Herbert de Souza, o Betinho, escreveu um artigo intitulado Como matar uma estatal, antecipando a grande onda de privatizações levada a cabo pelos governos Collor e FHC. A trajetória recente da Eletrobras indica que o atual governo federal retomou a tentativa de aplicar a receita fatal, pondo em risco esse ativo de importância estratégica para a soberania brasileira.
Betinho aponta sete medidas que, isoladas ou em conjunto, colocam a estatal rumo ao esfacelamento. Vejamos as medidas e sua aplicabilidade ao caso da Eletrobras:
1) Produzir com eficiência e vender abaixo do custoCom a MP 579/12, o governo antecipou a renovação das concessões de hidrelétricas e de linhas de transmissão impondo tarifas muito reduzidas à Eletrobras. As tarifas impostas são aproximadamente 90% menores do que as vigentes antes da MP.
Em 2014, por exemplo, a Eletrobras vendeu uma grande quantidade de energia oriunda das usinas renovadas por R$28,00/MWh, enquanto o MWh de energia era negociado a R$822,00 no mercado livre. Mesmo não sendo a medida suficiente para garantir a prometida redução nas tarifas elétricas, ela foi extremamente eficiente no que se refere ao sucateamento da Eletrobras.
2) O endividamentoComo bem disse Betinho, uma “boa” estatal brasileira serve para transferir recursos ao Tesouro em momentos de crise e para contrair dívidas. E, como consequência, “a pressão da dívida imobiliza a capacidade de investimento da estatal, e essa é uma boa fragilidade a ser utilizada quando necessário”.
ras pagou mais de R$9 bilhões de juros sobre capital próprio (1), mesmo tendo acumulado nesse mesmo período um prejuízo de R$20 bilhões! Parte desse recurso se destinou à União e foi utilizado para o atingimento das metas fiscais.
Quanto ao endividamento, entre 2013 e 2014 a dívida líquida consolidada da Eletrobras saltou de R$2 bilhões para R$15 bilhões (2). O governo segue, assim, as características fundamentais da receita fatal, um endividamento voltado para o atendimento das metas fiscais e a crescente submissão aos credores privados.
3) Não investir em pesquisa e desenvolvimentoBetinho fala em “conter os investimentos” com o “objetivo de colocar as estatais na fronteira da vulnerabilidade”. A Eletrobras recebeu o tiro de misericórdia com a MP 579, que reduziu brutalmente sua capacidade de investimento. Hoje a empresa encara dificuldades não só para cumprir seu plano de investimentos, mas também para honrar seus compromissos, tamanha a dificuldade de caixa.
A redução dos investimentos estatais, além de afetar a eficiência e a qualidade dos serviços prestados, também abre espaço para o crescimento do setor privado e, assim, o fornecimento e a distribuição de energia elétrica perdem, aos poucos, seu caráter de serviço público.
Avisava Betinho que “uma estatal muito eficiente é um mau exemplo no mundo dos negócios como argumento pró-estatização. Uma estatal ineficiente é um argumento imbatível sempre que for necessário restabelecer o primado neoliberal da livre iniciativa e das leis do mercado”.
4) Colocar afilhados na direção das estataisO caminho para destruir a estatal fica mais curto quando se coloca na condução das estatais “dirigentes que respondam pelos interesses de turno à frente da Presidência da República”. Não é de hoje que a Eletrobras sofre com esse mal. A Eletrobras, que foi durante muitos anos “área de influência” de ACM, já há algum tempo é considerada “área do Sarney”, mas também tem diretores ligados a Kassab e Temer, e Eduardo Cunha e Antônio Palocci ainda possuem influência nas controladas da Eletrobras.
Esse empreguismo político tem como objetivo não somente dirigir as estatais segundo os princípios da política econômica de turno, como pretende também desestabilizar sua base ética de sustentação. Ao se privatizar a direção de uma estatal, ela perde o seu carisma público”. O quadro se agrava quando se aponta para o envolvimento de diretores da empresa em esquemas de corrupção, como nas operações Faktor, Castelo de Areia e, mais recentemente, na operação Lava-Jato.
5) Provocar os sindicatosÉ importante também provocar os sindicatos e levá-los a situações de impasse. O desgaste progressivo dos sindicatos é uma boa preparação para a privatização”. A relação entre o governo federal e a CUT há muito coloca a central sindical em situação delicada. O apoio da central que representa os eletricitários ao governo entra em choque com os recentes avanços do governo contra os direitos dos trabalhadores e suas medidas privatizantes, levando os sindicatos a assumir posições contraditórias. “Nada melhor para privatização do que um sindicato desmoralizado e enfraquecido”.
6) Desenvolver os impasses até o absurdoÉ necessário levar os impasses entre as empresas estatais e o desenvolvimento do país ao extremo, para que o absurdo pareça ser a solução e a solução que convém a uns poucos acabe nascendo, como resultado natural do absurdo”.
Destacam-se aqui duas grandes frentes de impasse. Na primeira estão os grandes projetos com a participação da Eletrobras, como Belo Monte. Esses projetos vão afetar Terras Indígenas e populações tradicionais, além de representarem uma grande ameaça à biodiversidade. Condenáveis do ponto de vista dos direitos humanos e da defesa do meio ambiente, servem também como fonte de descrédito da empresa frente a movimentos sociais organizados e a sociedade.
Outra fonte de impasse é o atual modelo do setor elétrico e sua consequência mais explícita, os altos preços da energia elétrica. A atuação da Eletrobras ainda é marcada pela eficiência operacional e pela sua contribuição para a redução dos preços de energia, seja vendendo energia barata, seja entrando em leilões pressionando os preços para baixo.
Os altos preços de energia são resultado do modelo mercantil adotado, e não da atuação específica da empresa. Mesmo assim, o senso comum, “ajudado” pelos meios de comunicação, costuma associar esses preços a uma suposta ineficiência da empresa, quando na verdade sua contribuição vai à direção contrária.
Os preços altos cumprem assim duas funções. De um lado servem à tentativa de justificar os grandes projetos, apoiados incondicionalmente pelas construtoras. De outro lado, servem aos defensores da privatização, apoiados pelo trabalho de desinformação planejada da mídia.
7) Vender ou fecharA Eletrobras caminha a passos largos para sua privatização. Os alvos iniciais são as suas distribuidoras, mas tudo indica que a intenção não é parar por aí (3). As ações da Eletrobras estão valendo hoje 1/3 do preço de cinco anos atrás.
Uma empresa que vive em crise tem baixa cotação no mercado. A privatização gosta de preços baixos, principalmente de empresas públicas que acumularam durante décadas o patrimônio que foi construído com o dinheiro e o esforço de todos”.
Como mostra a experiência real, a privatização não é sinônimo de aumento de eficiência e qualidade do serviço. De outro lado, a privatização significa, inexoravelmente, demissões! Além disso, o setor elétrico é um dos pilares da economia e seu desempenho tem impactos sistêmicos. A privatização desse setor significa deixá-lo a serviço dos lucros e não da sociedade.
NotasAs aspas simples são usadas na reprodução de trechos do texto original e o uso de aspas duplas para dar destaque ou para realçar palavras ou expressões irônicas.
(1) Fonte: Eletrobras, dados disponíveis em aqui – Valor considera o pagamento de dividendos correntes, de dividendos retidos e de juros sobre o capital próprio.
(2) Fonte: Eletrobras Informe aos investidores 4T14.
(3) A Eletrobras pretende aprovar, no apagar das luzes de 2015, a privatização das distribuidoras. A AGE da empresa para aprovação da privatização está marcada para o dia 28/12/2015.